O barulho do ventilador embutido no elevador.
Mal refrescava, aquele ar. À esquerda, a tela do tamanho de
uma folha A4 mostrava a tabela do campeonato brasileiro. Estávamos só os dois
ali dentro, e o elevador surpreendentemente não parou em nenhum andar, mas
mesmo assim a descida pareceu levar uma eternidade.
O tempo costuma demorar a passar quando procuramos palavras.
Na rua, ele colocou os óculos escuros que trazia pendurados
na gola da camisa.
- E aí, aonde vamos? Não vou poder demorar muito. Marcaram
agora de manhã uma reunião à uma e meia...
Era sempre assim. Ou vinha sendo sempre assim, há mais tempo
do que eu conseguia lembrar. Fazia parecer um favor. Pronto, estou aqui, cedendo uma hora do meu precioso tempo e da minha
valiosa presença pra ti. Não era isso que tu queria?
***
Sentamos em uma das mesas ao lado da janela. Pedimos nossas
bebidas. O garçom riscou uma comanda e a deixou sobre a mesa.
- E aí, como vão as coisas?
- Tudo certo, eu acho. E contigo? Parece bem ocupado.
- É, é muita coisa. Mas tá tudo bem. Tirando não ter mais
tempo pras coisas.
Nos servimos e começamos a comer, em silêncio.
...
- Acho que finalmente aprendi a me manter assim, sabe? Sem
deixar as coisas me afetarem. E aí fica tudo bem. Claro, não chego a me
empolgar com quase nada, mas pelo menos não sofro que nem antes.
- Que bom, se isso funciona pra ti.
...
- E como tão as coisas com a Bruna?
- Ah! Não te falei? Decidimos morar juntos.
- Não falou. Que bom! Ficou sério mesmo, então?
- Parece que sim, né?
- Pois é! Mas, sério, que bom! Tomara que dê certo.
...
- E tu? Alguma novidade nesse sentido?
- Nada que tu já não saiba.
- Não rolou lá com o carinha?
- Ah, sei lá. A gente conversa, eventualmente. Mas se ele
quisesse alguma coisa já tinha acontecido. Eu já dei todas as aberturas
possíveis. Enchi o saco de ficar tentando. Se não volta, não volta. Né?
...
***
Houve
o tempo em que não sabíamos o que dizer porque tínhamos o que dizer. O mundo dentro de nós. E agora o
que nos restava era isso – almoços de superfície, temperados por silêncios
desconfortáveis.
Quando nos tornamos essas pessoas? Que nunca têm tempo, mas
nunca têm culpa?
Eu queria dizer isso para ele. Queria dizer que as escolhas
são nossas. Que as prioridades e o tempo são escolhas nossas.
***
Ele comia rápido. Tinha recém passado da metade do meu prato
quando vi que ele colocou na boca a última garfada. E eu não poderia adivinhar
se era sempre assim ou só porque estava comigo. Pensei em acelerar, mas também
pensei: foda-se, esse não é um problema meu.
Me lembrei do Piglia: “Eu tinha esquecido as
palavras para falar com ela”. Era isso. Eu não tinha mais as palavras para
falar com ele.
Queria a amizade que já não existia. E lutava por uma
proximidade impossível de ser recuperada. Não
era isso que tu queria?
***
De repente, mais coisas nos separavam do que nos uniam. De
repente, o que antes costumava nos unir agora nos separava.
- Pode ir subindo se quiser. Vou ficar aqui pra fumar um
cigarro. Tu parou mesmo, né?
- Parei.