25 de janeiro de 2012

a noite e o dia seguinte II

Contrários e outros lados são difíceis, sendo entes, mas, quem garante, poderia ser esse o propósito, afinal. Bom é quando as frases e também os dias saem sem pensar, como passos, um depois do outro. E a mão que puxa, destruindo a zona de conforto e estourando a bolha. A mão que entra sem ser convidada, que passa sem arrepiar. O gosto de nojo além da boca, em todo um corpo, sujo. A sujeira. A pior pessoa viva, a constatação da hora e, por dias, recorrente. E foi aquele um mal estar inédito, não por conta da vida e do cotidiano, mas em decorrência de existir e, uma vez existente, de sujeitar-se a tamanha sordidez. Quero estar em outro lugar, longe daqui, longe disso. A sujeira do mundo dentro da boca, na ponta da língua, escorrendo pelas pernas, chegando em seu lugar. Como qualquer coisa inevitável cercada de tentativas inúteis de estancamento, antes que se espalhe, antes que tome conta, antes que seja tarde. Mas então já é. Tarde para dizer não, fazer parar. Em uma dança arrítmica, de passos descompassados, de tropeços ridículos e exageros torpes. Seguimos opostos, desafiando as leis da física com uma atração mútua mentirosa. Ver de perto, querer longe, ter longe, ver de longe. De longe. Porque é à distância que se torna belo o que ao alcance das mãos não merece ser olhado. Tu me pergunta por quê e eu prefiro o silêncio e dele abdico por uma questão de princípios. Que princípios eu posso ter? Que princípios o mundo merece que eu tenha? Padecendo horas que se estendem, brincando com a minha paciência e saúde, dizendo que não vamos passar até que você queira vomitar. Só para poder sair, respirar o ar do início de manhã cinzenta, esconder-se da vida. A claridade consumando sua presença. A inércia repugnante estirada no colchão. Meu dia seguinte chegou. Abre a porta que quero ir embora.

4 de janeiro de 2012

a noite e o dia seguinte

Te deixar ir e na porta te perguntar mais uma bobagem pra te segurar na minha frente mais um instante como quem diz fica, fica porque eu te amo. Não soltar o abraço. E pegar na tua mão e fazer o caminho de volta até o sofá e depois o quarto. Deixa, deixa a noite e a madrugada, amanhã é outro dia e agora nós merecemos. Um o outro, apenas. Esses rostos envelhecidos não dizem nada, fazem lembrar que o tempo é cruel e a vida não vai nos poupar. Eu quero passar o dia na cama outra vez, discutindo o almoço até as quatro, perder o sábado, perder o tempo. O tempo é cruel. Vem, me esquenta embaixo do edredom no inverno e acaba com o que me restar de consciência. E inocência. Que dessas coisas eu já tive demais e a vida já é tão séria, carrancuda nos esperando no portão todas as manhãs. Quero esquecer contigo. E fazer planos sem necessidade de cumprir, mas pela necessidade de fazer. Pelo gosto de nos imaginar pintando paredes e discutindo onde colocar o sofá, o indispensável. Vem arquitetar comigo um futuro qualquer pra nós dois. Mas vem agora porque eu não quero ter tempo nem ocasião oportuna pra reconsiderar. Tantas coisas eu reconsidero e abdico em prol de nada. Em detrimento de nada. Como se a nada fosse que o tudo se resumisse. Meu tudo talvez seja pouco e talvez não seja o suficiente pra mim, mas tem o tamanho certo. Chega de madrugada, me liga sem avisar. Olha pra mim e vê as palavras que eu não digo. Vê quando eu te olho que nos meus olhos tem amor, que não tem lugar nem hora nem rosto, só toma forma e permanece. Quero passar a mão nos teus cabelos, te ver voltando pra cama no escuro, deitar no teu peito e te sentir respirar. O ar entrando e saindo em contínuo. Como encher cadernos com coisas aleatórias que de repente vieram à cabeça. E depois reler e enxergar que as poucas e as muitas coisas mudam simultâneas, que nada se pode fazer. Como varrer as calçadas e ver a sujeira acumular-se para depois desaparecer: pra onde vai? - pra onde foi? Me dá um beijo e esquece. Olha a noite comigo do terraço, as janelas iluminadas dos outros prédios e o céu cheio de estrelas prometendo sol no dia seguinte. O dia seguinte é só uma promessa. Vem agora.