15 de abril de 2012

a solidão

Solidão não tem dono. Minha solidão, tua solidão. A gente longe um do outro porque juntos já não andávamos para frente, porque é melhor assim. Encho-me de ocupações até não sobrarem cinco minutos do meu tempo. Porque cinco minutos são o suficiente para sentir o vazio e a solidão e a dor de estar sozinho em um mundo feito para dois. Lugares dispostos aos pares nos ônibus, bancos para duas pessoas nos parques, mesas para dois nos restaurantes, promoções e ingressos para você e um acompanhante. O mundo esquece dos solitários e a vida não dá conta de encontrar um lugar para nós, que estamos sempre encostados em paredes, apoiados em colunas, fumando um cigarro, fingindo mandar uma mensagem no celular, escondidos atrás do que na verdade já lemos. Levantamos os olhos, olhamos em volta. Nada. E num existir entre ser e não ser sozinho, consolos que vêm em silêncios, no não-ter-o-que-dizer de outrem. Dos sorrisos não cientes que fazem coro com o poeta cantando que é impossível ser feliz sozinho. Da saudade de companhia e não da companhia em si e que portanto talvez não seria saudade? Todo o mundo o tempo todo, de um jeito ou de outro. Eu nunca. Vejo o vazio na camisola que não tem para quem ser usada e na barba que não raspa em outras bocas. Na falta da mão para dar, vêm os dias que também vão indo. O soprar das coisas e o arrastar das manhãs, a espera do ônibus, o verde de longe. Meus olhos percorrem os outros olhos, à procura de um rosto qualquer de melancolia, vislumbrando tudo o que poderia ser. Sem ser. Entre realidade, fantasia e ficção, quem pode nos culpar. Quando as três se confundem, ideias que não se aprumam, vida que toma forma em outro lugar. Na doçura dos ritmos que potencializam a solidão. Há dias em que simplesmente não vivemos. Mesmo que o futuro não possa esperar, paro meu relógio e deixo. Existiu uma vez um sentimento tão forte que poderia arrebentar; e agora existem imagens borradas. Há dias em que simplesmente não queremos viver. Nesses dias não nascemos e não crescemos, nesses dias não somos sequer o borrão na parede. E até o borrão é mais vivo nos dias em que não vivemos. Voz de poesia morta. Garganta seca e catarro. As sobras e os restos. Estou feliz demais, e isso agora é desculpa para terminar. E dos fins a vida se faz: fins e meios, mas sempre fins. Bem longe daqui fica um lugar bonito, e lá vale a pena estar, mas ainda lá estarei sozinho. O mundo esquece a gente, mas a gente não esquece o mundo, que as bicicletas individuais já não dão conta da nossa existência. Perdidos na vontade de se encontrar – ou de encontrar, simplesmente. Carrego em mim todas as marcas, as mentiras e as ausências. De quem eu criei e quis que fosse. De quem nem existe senão na minha imaginação. As tarefas esperam por um momento propício, acumulam-se e não se fazem. Não quero fazê-las porque tenho mais o que fazer – o quê? E quem eu sou para ter o que fazer? Esperando sozinho. Esperando e esperar. A maioria das pessoas quer viver. A maioria tem uma vida difícil, com trabalhos indignos ou trabalho nenhum, dívidas, carências – e mesmo assim ainda querem viver. De alguma forma, elas encontraram uma razão. De alguma forma, eu nunca encontrei a minha. Talvez eu nunca encontre. Jogo minha cara no espelho, recolho os cacos sob o chuveiro e enterro o que sobrar no sofá, surdo do mundo. Numa noite, tu és distante e és perto, e contrariando todas as vontades e possibilidades ser um ou ser outro já não traz diferenças. Porque o que havia nós destruímos, como fazemos com tudo o que não é uma forma de agrado. E enquanto te imagino dançar no ritmo estranho da música, me deixo estar, porque só posso estar e não há mais nada para mim. Lá (fora), aqui (dentro). Não há tanto que separe, não há quase nada que una. John canta as palavras de Paul. Todas as pessoas solitárias – de onde elas vieram? Todas as pessoas solitárias – qual o lugar delas?