7 de setembro de 2010

solidão acompanhada

Fui chamada lá e nem sabia por quê. Soube que queriam falar comigo, qualquer coisa com relação a outras coisas ainda não resolvidas. Mas eu não costumava conversar muito com nenhum deles, então por que de repente queriam a minha presença? Que adicional eu traria a um assunto tão desimportante para qualquer pessoa sensata? Mas eu fui. É parte de mim atender quando me chamam, menos por vontade de fazer o que quer que possam pedir do que por alguma satisfação em ser requisitada.

Eu estava na casa de uns primos - e agora não sou capaz de recordar o porquê de estar lá, uma vez que pouco falo com eles também - que foram gentis em me oferecer carona. Ao chegar, um grupo de pessoas veio em minha direção, sorridente, quase de braços abertos para um abraço absurdo, e uma delas me informou alegremente que ele queria falar comigo. Perguntei onde ele estava, muito surpresa com o que acabara de ouvir. "Lá em cima", disseram, "no corredor".

Eu não sabia que corredor era aquele, nunca havia estado lá antes. Ou talvez já estivesse estado, e minha memória estava a me enganar mais uma vez, como costuma acontecer, de quando em quando. É bem possível, eu pensei.

Cheguei ao último degrau da escada e virei a esquerda para entrar no corredor. O chão era um piso de ladrilhos beges já bastante gastos, havia várias portas de ambos os lados e, por alguma razão a mim ainda obscura - talvez falta de atenção ou interesse, talvez pelo comprimento -, eu não consegui enxergar o fundo do corredor. Havia pessoas escoradas aleatoriamente pela parede ao longo da extensão que eu percorri, e algumas sentados no chão. Quando finalmente o encontrei, ele era um dos sentados no chão, tive a impressão de que era o último - a última pessoa postada naquele corredor, matando tempo; não havia mais ninguém até o misterioso fim que eu não pude enxergar. Poderiam meus olhos me enganar também, além da minha memória? É bem possível, eu pensei outra vez.

Nós pouco nos conhecíamos. Na segunda vez em que o vi, eu sóbria, ele bêbado, estávamos em uma festa de início de aulas da faculdade - ou, em melhores termos, uma despedida das férias. Ele caminhava pela calçada cantando e falando sem parar coisas na maioria incompreensíveis, segurava uma garrafa de cerveja vazia na mão e jogava as pernas de qualquer maneira uma na frente da outra, em uma tentativa vã de andar em linha reta. "Quem vai contribuir pra mais uma?", ele perguntou, rindo. Eu pus algumas moedas na mão dele e nós dividimos uma cerveja. E foi isso. Depois daquela noite, eventualmente nos encontramos e dizemos oi ou participamos de uma mesma roda de conversa - é o nosso vínculo. Tendo consciência disso e não sendo eu uma participante muito ativa dos eventos acadêmicos festivos - e tendo consciência disso também -, fiquei curiosa ao saber que ele procurava por mim.

Sentei ao lado dele, no chão.

"E aí, disseram que tu tava me procurando."

Ele estava rindo sozinho. Os olhos claros brilhando no rosto de bochechas rosadas levemente escondido pela barba e cabelos. Não tivesse certeza do contrário, eu poderia dizer que ele estava bêbado também na ocasião.

"É, eu quero um beijo", ele respondeu, para minha surpresa ainda maior, em um misto de riso e seriedade, e eu não pude decifrar qual era o verdadeiro - ou se ambos o eram.

Fomos para a rua. Os dois rindo sem qualquer motivo aparente. Não tivesse a infeliz certeza do contrário, eu poderia dizer que estávamos chapados.

Paramos próximos a uma mesa próxima a uma parede escura. Ele riu pra mim, e eu acariciei o rosto dele, percorrendo com os dedos a bochecha direita dele. Era uma pele inesperadamente lisa e macia, como a de um bebê, daqueles de rosto gordinho. Eu ri ao pensar nisso. Ele beijou meu rosto e pegou na minha mão. Ele usava uma camiseta de mangas curtas, de maneira que eu pude ver e tocar seu braço. E a mão. Mãos de homem. Como se tivessem sido cuidadosamente desenhadas e planejadas para ser exatamente como eram naquele dia. Nós ainda sorríamos sem qualquer motivo aparente.

"Eu tenho namorado."

"..."

Nós ainda sorríamos.

"Ele nem vai saber."

"Não. Eu quero que tu confie em mim, se um dia acontecer, né."

Nós ainda sorríamos e nesse momento nós rimos. Ele riu. Não sou capaz de lembrar o que ele disse em seguida. Talvez não tenha dito nada, apenas rido. Talvez tenha me abraçado e ido embora ainda sorrindo com os olhos claros brilhando no rosto de feições interioranas. Eu não me lembro. Antes de ele ir, contudo, eu percebi que minha mãe me esperava no carro, parado a poucos metros da mesa em que nós estávamos escorados, ensaiando uma história de mentira, sorrindo sem qualquer motivo aparente.

Ele foi embora de repente, sem que eu percebesse.

"Por que tu ficou esperando sem fazer nada, se tu sabia que não tava acontecendo nada? Que não tinha ninguém de verdade ali?", eu perguntei a ela, que me olhava meio perplexa.

O problema nunca vai ser estar sozinha, eu pensei; o problema é não estar sozinha e, no entanto, sempre estar. É o pior tipo de solidão, a acompanhada.