12 de janeiro de 2016

em breve

Demorou para eu perceber que breve significava muitas coisas, menos um espaço curto de tempo.

Esperei por aquele dia como quem espera por uma festa qualquer, e até poucos minutos antes sequer tinha decidido o que vestir. Não tá frio, não tá quente, posso usar uma meia calça e levo um casaco. Lá dentro vai estar cheio, não vou passar frio. Esse vestido, pode ser. É na hora de sair que vem a ansiedade. Faz tempo. O que vamos dizer, depois de tantos anos? Nunca mais vimos a cara um do outro. E se não houver o que dizer? Vamos nos encarar? Desviar o olhar?

Chovia, mas os cabelos nunca importaram. Na medida em que o táxi avançava, olhava para as luzes dos postes - passando, uma após a outra, como todos os dias. Fugazes demais para serem percebidas em detalhe, mas ao mesmo tempo únicas, cada uma nos segundos e no espaço da cidade que lhe compete. Agora não tem volta, e eu não me perdoaria se não fosse adiante. Sempre em frente, ainda que retrocedendo de quando em quando.

Pedi uma cerveja e sentei no balcão. A solidão nos balcões tende a ser mais aceitável e mais fácil de aturar que a de uma mesa. Não recorri ao celular. Em vez disso, olhei para as paredes, onde quadros com imagens e frases misturavam-se a luminárias aqui e ali. As mesas foram ocupadas, e grupos de pessoas muito parecidas umas com as outras somavam à musica o som dos copos, das conversas e das risadas altas demais. Não era possível distinguir nenhuma frase inteira, no máximo palavras - show, amanhã, domingo, eles, essa música, mais uma.

Ele chegou na segunda cerveja. Começou a circular entre as mesas, cumprimentando conhecidos. Não sei se não me viu ou só fingiu não ver. Terminei o último copo e levantei para ir - ao banheiro? Qualquer lugar longe dali. Na rua, a chuva havia diminuído. Mais uma vez, olho para a luz dos postes. Agora em detalhe - como os dias enquanto ainda não passaram por completo. Penso em simplesmente sair andando. Virar a esquina e nunca mais voltar pra essa cidade. Como se fosse possível evitar um encontro inevitável.

Penso em quão ridículo e inexplicável era tudo aquilo. O simples fato de eu estar ali. Quando me viro, ele está ao meu lado. Dessa vez, me vê. Ou não é possível fingir que não. O reconhecimento vem aos pedaços. Demoro a perceber que a voz é a mesma. Assimilo em partes, uma a uma, e não por inteiro. O rosto, em seguida os cabelos e por fim os gestos. Pergunto se está nervoso, falamos brevemente. Não para de se mexer e de olhar para os lados. Me agradece por ter ido. Toda aquela linguagem corporal. Traços que o passado conhecia tão bem e que o presente demorava a entender como algo conhecido.

A mistura de luzes e sons foi única. Memorável. A suavidade das melodias em contraste com a intensidade com que ele tocou e entoou cada uma. Senti lágrimas breves nos olhos. A felicidade de ver feliz. Como algumas sensações, que bastam por si próprias, músicas são difíceis ou impossíveis de se descrever. Porque nunca vêm sós: há sempre algo mais. Uma lembrança, um sentimento, uma maneira de chegar aos ouvidos e ser absorvida pelo corpo que é singular e escapa às palavras.

Ao final, me afastei, deixando que o rodeassem todos os que estavam ali e queriam dar um abraço, dividir congratulações e palavras de carinho. Voltei à rua e fiquei - buscando um significado inexistente, tentando alcançar algo há muito fora de alcance. Despediu-se de mim com aquele nos falamos em breve. Nenhum amor deveria durar até acabar, e talvez os melhores sejam exatamente os que acabam. No mais, é só o silêncio. Em cada música, todos os dias.