14 de julho de 2010

falaria

Eu tinha vontade de contar. De falar tudo aquilo que eu sempre guardo. De falar, falar, falar, só falar, por minutos e minutos seguidos. Soltar todas as palavras no ar, para que pairem entre nós, silenciosas, até que se decida o que fazer com elas. Não para causar mudanças - mas podem palavras serem ditas sem que algo mude no mesmo instante? -, não para suscitar reflexões desnecessárias. Apenas para desabafar - um desabafo que não é desabafo, de coisas mundanas e de uma rotina sem graça, mas que de tão contidas e por tanto tempo parecem enormes. Dividir: porque ao dividir uma tristeza ela diminui e ao dividir uma alegria ela aumenta. Falaria da morte do meu avô, de episódios aleatórios da minha infância, de pensamentos que me ocorrem no ônibus ou enquanto leio, de sensações que me assolam repentinamente de quando em quando, em frente à lareira ou sob o sol no jardim. Falaria do que eu ouso pensar a respeito do amor. (Ouso, porque o amor é algo fora do alcance do raciocínio humano. Sempre tive e tenho ainda problemas com o amor. A incompreensão do porquê de todas as pessoas não se acomodarem, como eu, a uma sensação tão constante e tranqüila e deixar que ela tome conta de tudo dali para frente. A incapacidade de tomar conta da própria cabeça. O desejo insano e incontrolável pelo eterno.) Falaria das idéias ainda engatinhantes do que eu julgo um ideal de futuro. (Sempre tive e tenho ainda problemas também com o futuro. Por razões que vão muito além do manjado porém não por isso insincero 'não saber o que fazer da vida'. É algo intrínseco, que não me deixa ser otimista ou fazer planos, que não me deixa pensar em nada diferente do fracasso e da mediocridade quando o som da palavra - futuro, futuro! - me chega aos ouvidos.) Falaria dos livros que eu leio. E dos devaneios que passam por mim à noite quando tenho dificuldade de dormir. Eu falaria.