1 de dezembro de 2013

o erro de imaginação

Sobre como estamos sempre dizendo adeus:
- Adeus.

Se eu pudesse escrever em acordes, e botar no texto os sons que dizem o que não é possível escrever, em palavras invisíveis e sonoras que permitiriam ouvir a quem lê, então talvez eu pudesse escrever sobre como é difícil dizer adeus.

Às vezes é preciso dizer. Que seja assim na vida e nos textos como nas canções é um querer distante, como ilíadas e odisseias. E à medida que a tinta acaba, e não há mais o que dizer ou razões pelas quais continuar, é preciso deixar ir.

Você diz que sou Borges, e para mim o amor não pode ser outra coisa senão o semblante sorridente de Borges. Como abrir mão de algo tão belo? Mas não há resposta possível. Para nós como para nossas perguntas, que então permanecemos: silêncio.

Vendi minha memória para nunca segurar sua mão outra vez. O mundo a levou quase de graça; uns poucos momentos, flashes de alguns meses e nada mais. Em troca, me deixou essa atroz consciência. Nunca seremos outra vez.

Você, que me lê, consegue perceber o que eu não digo?

Me lembro sempre das coisas que gostaria de dizer. E nesses momentos tenho a sensação de que poderia encher todos os livros do mundo. Se chove o barulho já não machuca como antes; e se as palavras não vêm eu sei que há muito que não pode ser escrito. Para algumas sensações - certos conjuntos de sensações, combinados com momentos específicos, atrelados a uma luminosidade, temperatura e humor, ligados a sons e pensamentos passados naquele instante - um instante único no espaço e no tempo - não há correspondência escrita.

São anos de não ditos que um dia serão eternidade. Com você me tornei o que mais odiava. A insegurança de dizer adeus que acumulada fazia de mim um apêndice. Onde está você? Até assumir o último adeus.

Amor é quando as mãos se tocam pela primeira vez, e não os rostos, as bocas ou as línguas. Deixamos nossas taças sobre a mureta para sentir. Poucos beijos são capazes de superar o primeiro. E as mãos se reconhecem porque agora são as mãos de um casal que não é nenhum outro. Um vestido, uma camiseta, óculos e sorrisos, dois.

Um. Você tirou de mim minha capacidade de me apaixonar. Dois. Eu ainda fico feliz por vê-lo feliz.

Quando a vida, aos poucos, vai sendo substituída por outra coisa, é difícil expressar mudanças. Não há mais nada, se um dia houve. Não há o que garanta a certeza, ou qualquer certeza, se não sou a pessoa que imaginei que seria ou se sou exatamente o que imaginei.

Talvez o mundo todo seja um erro de imaginação.

Acordo da vida lendo no inverno. E bem longe de mim escrevo as últimas palavras. Sobre como é difícil dizer adeus. Que seja assim na vida como nas canções. Para sempre sonho, para sempre mentira.

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