20 de setembro de 2012

o patético

- Por que tu não procura alguém num desses sites? Vai que tu conhece um cara decente e se apaixona como nunca antes.
- Até que eu queria, mas eu não vivo num filme.
- Mas pode acontecer. Como tu sabe que não?
- Sim.
- Tipo em Must Love Dogs.
- Aham, daí mês que vem eu te apresento o John Cusack.
- Tá, tá. Mas o que eu perguntei tu não respondeu. Por que não?

E eu respondi que “é, quem sabe numa dessas eu tento” e ouvi meu amigo comentar sobre a série a que assistíamos, jogados no sofá sem qualquer preocupação com a chuva que desabava do lado de fora, já pelo terceiro ou quarto dia. A cidade passava por uma semana caótica, e, para quem aparentemente já veio ao mundo com tendência a não sair do lugar, ficar em casa o máximo de tempo possível não foi uma decisão difícil. Eu sempre soube me acomodar.

Por que eu não tentava? Meu amigo conhecera o namorado assim, os dois moravam juntos há dois anos. A sucessão improvável de fatos que me levou a conhecer meu ex – duas pessoas que escreviam blogs e liam o blog uma da outra sem saber de quem era a autoria até que foram apresentadas por um amigo em comum que não sabiam que tinham – talvez seja um exemplo de que histórias de filmes podem acontecer na vida. Eu já tivera a minha, e esperar que uma segunda sorte desse tipo se manifestasse era no mínimo tolice.

Fora há mais de três anos, e desde então eu não me relacionara com mais ninguém. Acostumara-me de tal forma não à solidão, mas a ser sozinha, que era, àquela altura, difícil imaginar um cenário diferente. Ter de novo uma segunda escova de dentes na pia, roupas masculinas no armário, pelos no sabonete, outra vez dividir a cama, o banheiro, o carro, as contas, a vida. 

- Mas não precisa ser assim.
- Mas sempre acaba sendo assim, tu sabe.

Era medo e era, também, preguiça de outra vez rearranjar minha vida a fim de acomodá-la a uma companhia que, mais cedo ou mais tarde, iria embora deixando a bagunça para mim. Da forma que estou, eu sei viver.

Para algumas pessoas, parece sempre funcionar. Elas encontram novas pessoas e tudo, de novo, funciona maravilhosamente. Para outras, simplesmente não acontece. Sorte ou azar, por ser bonita, não é difícil encontrar homens. Eu durmo na cama deles, eles pegam meu número, ligam no dia seguinte. Mas é uma janela que se fecha depressa, como depressa diminui a minha vontade de passar a noite com esses homens. Sempre imaginei para mim alguém com quem pudesse conversar, e agora, aos trinta, começo a descobrir, a aceitar, que talvez essa pessoa não exista, que talvez eu nunca a conheça. Viver sem amor é estranho, perigoso e uma perda. É difícil acreditar que, tendo só noventa anos para viver, seja possível passar até um terço deles sem amar. Não faz sentido.

Lembro ainda da primeira vez que fui chamada, naturalmente, de mulher. Mulher, não guria, menina, garota, mina. "Você é uma mulher incrível, e se interessa por coisas que te diferenciam das outras mulheres; a maioria delas é exatamente igual", ele escreveu, em inglês, em um e-mail. Woman. Irônico que o primeiro homem a me chamar de mulher tenha sido um homem de outro país. Ou talvez fosse um detalhe a que eu devesse ter prestado atenção. Ele escrevia e viajava muito. Durante o período em que nos correspondemos, morou em pelo menos cinco cidades, cada uma de um estado. Ele levava uma vida que eu também gostaria de ter, e eu deveria ter ido encontrá-lo, como chegamos a imaginar. A faculdade não teria sido uma perda.

Mas eu fiquei, e aqui, ao caminhar, decoro as pedras soltas e os desenhos das calçadas em caminhos repetidos à exaustão, quase milimetricamente. Sozinha, pelo rigor da sorte ou culpa própria.

Alguém já disse uma vez que a humanidade daria um salto se cada ser humano, ao levantar de manhã, olhasse para si mesmo no espelho e repetisse: "Patético. Patético. Patético. Você é patético". Poderia funcionar, não fosse o fato de que somos patéticos demais para admitir, mesmo que só para nós mesmos, o quanto somos patéticos.

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