Saiu atendendo uma ligação no celular. Não, não vou pra
casa agora. Parei aqui, em algum lugar. A placa na esquina com o nome da rua, familiar.
Já vista. Onde? Em uma foto? Que foto? E então ela deu conta da casa sem
cercas, logo ali.
Um grupo de pessoas observava do jardim. Olhavam como se perguntassem quem é, o que ela está fazendo, o que quer aqui. Nenhum um rosto conhecido além dos cabelos pretos e o sorriso de ponta a ponta, o carisma e a simpatia que o mundo nunca há de ver iguais em outro homem.
Depois eu ligo. Não sei, pode escolher. Não posso falar agora,
depois eu ligo. Aproximou-se da casa para cumprimentá-lo, e as pessoas que
antes olhavam desconfiadas rodearam-na convidativas. Vem, vamos entrar.
Muitos sorrisos. Era de família, então?
Ele a acompanhava, esperando para que pudessem conversar, por quê?, e uma
mulher chegou pelo outro lado. A mãe? Vai deixar o carro na rua? Pode deixar
que ponho ele pra dentro. Não, não precisa, imagina. Não, por favor. E lá se
foi a mulher, com as chaves, trazer o carro para dentro do terreno.
De repente não se podia mais vê-lo, vermelho que era. Foram atrás,
e nos fundos da casa um desnível no terreno. O carro preso, caído ali. Não se
preocupe, querida, nós vamos tirar ele daí depois.
Ela viu o corpo tomado pelo desespero e deu as costas. E agora? Meu deus. Meu deus. E agora? Sentiu o puxão forte no braço, e o olhar terno e sereno. Tão cúmplices, ali, sedentos de distância e silêncio.
Eu tenho cerceado a mim mesma por anos, constantemente me policiando, a fim de não pensar certas coisas, não sonhar com outras, não fazer outras ainda. É uma política sem sentido. Eu quero fazer.O alcance dos corpos perante os desejos. As mãos, perfeitas, deslizando sobre a pele. Arrepio. Respirar no ouvido, olhar nos olhos. Fechar os olhos. Minha pele. Teu toque, teu cheiro.
O prazer que a vida pede e a gente atende.